Bem, no início de 2008 comecei a desenvolver
a idéia de publicar algo sobre a cena rock independente nacional dos anos 90.
Uma pretensão de relatar algo sobre a época, publicar na internet e depois,
talvez, um livro. Ruminei, consultei uns amigos e tracei um formato. O tema era
pretensioso e, o mais importante, dependente da boa vontade das pessoas. O
objetivo era meramente registrar. Temos um desleixo natural para as memórias,
afinal para frente é que se anda, como diria o Barão de Itararé, voltar pra trás
é "revoltar", concluiu ele. Descobri que não tenho o tino para
"revoltante", por isso estagnei com o projeto. Motivos vários, dificuldades
como: desânimo no “feedback”, incapacidade técnica, obrigações particulares e
um monte de abobrinhas...
Hoje, refletindo melhor, penso que o mais
adequado é mostrar, através das palavras dos amigos, que vivenciaram os anos
90, um pouco do que foi. Todos eles importantes no tempo e no espaço. E jamais
poderia faltar com isso. Não ouso chamar de memórias – nem perto disso -, mas tomem como
fragmentos de um todo. Postarei ao vento...
Disseram sobre o cenário do rock independente
nos anos 90:
"Acho que conseguimos sem perceber nem
nos importarmos com isso, criar um cenário independente no Brasil, com gente
pensando diferente e muito no tesão de fazer diferente, de criar espaços, criar
algo a gente mesmo, DIY mesmo com muita variedade e curiosidade, isso era
legal. Já tinha existido um cenário de rock nos anos 80 que era muito embasado
nas gravadoras grandes e em hits, nos 90 nós queríamos variedade e produzir
muito, cair na estrada mesmo". Rodrigo Lima (Dead Fish).
"A abertura do Brasil ao mundo, acho.
Nessa década chegou a TV a cabo, a MTV, importações e a Internet. Isso caiu
como uma bomba no meio de uma molecada que não estava amarrada por ideologia
alguma, sem aquela "radicalidade" "extremista" das tribos
dos anos 80 e sem o "compromisso político" superestimado dos jovens
dos anos 60 e 70". Bruno Privatti
(produtor e fanzineiro carioca).
"Eu cheguei a pegar o tempo do correio,
das cartas e pacotes que chegavam quase todos os dias, com sons novos, palavras
diferentes e tantas ideias, sempre em formato físico (flyers, fitas cassete,
fanzines, cdrs, cds). Mas depois chegou a internet e tudo mudou. Não sei se
para melhor, mas admito que tudo ficou mais acessível. Eu ainda resisti bem a
invasão, pois somente em 1999 eu fui ter internet disponível regularmente em
casa. Mas eu diria que o mais importante nos anos 90 foi a chegada da internet,
que condicionou mudanças, tais como a diminuição do numero de fanzines de papel
com a chegadas das personal web pages e dos weblogs, a diminuição do número de
demos com a chegada do mp3". César Zanin (músico e produtor paulista,
Moonrise, Woodland Records).
"Talvez duas coisas possam ser
consideradas marcos nos anos 90: o aparecimento do CD e a popularização da
internet. Apesar de representarem a evolução, também foram os principais
responsáveis pelo sumiço de fanzines em formato de papel e de fitas cassete e
discos de vinil. Não serei tão romântico ao ponto de chorar e falar que formato
tal era melhor que os digitais que dominam hoje. Acho que o formato digital
representa hoje a democracia à informação (mesmo que algumas vezes de forma
“ilegal”, como os downloads) que todos nós, que vivemos nos anos 90 merecíamos.
Uma pena que a geração de hoje não saiba usar esse meio de maneira ideal".
Márcio Sno (faneditor e documentarista paulista).
"Acho que a comunicação por zines,
cartas, fitas via correio, o início dos festivais, a abertura das casas de
shows para as bandas independentes. Como disse, na época, não existia internet.
E a comunicação era feita no boca-a-boca, por zines, cartas, etc. E funcionou
muito bem!!! Porque o movimento tomou uma proporção territorial que não
imaginava. Era gente de Manaus, vindo pra São Paulo e vice-versa, tudo
em nome do rock. As bandas se comunicavam, convidavam umas às outras para tocarem
juntas e assim a coisa foi se formando. Acho que isso se deve também muito aos
festivais que começaram a pipocar, exatamente com esse objetivo. Não existiam
as redes sociais, mas existiam os festivais reunindo pessoas com um objetivo e gosto
comum". Márcia Raele (produtora paulista, editou o zine Done).
"Uma coisa que eu achava legal nos anos
90 é que uma banda que era boa "aparecia" de certa forma na cena
independente. Era mais fácil, apesar de hoje em dia ter mais lugares pra se
divulgar. Não tinha tanta banda quanto hoje, eu acho. Tinha muita banda, muita
mesmo, mas as bandas conseguiam um destaque, pelo menos na cena local. Lembro
que os shows socavam naquela época, hoje em dia, se uma banda colocar 120
pagantes num show, chora de emoção. Aqui em Salvador, nos anos 90 isso era
praticamente um show vazio...". Rodrigo "Sputter" Chagas (The
Honkers)
fotos com as bandas Waterball e Killing Chainsaw.
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