6 de jan. de 2012

Telegramadoistresmeia


Telegrama 236 é uma novidade pop paraibana. Os editores do Jornal Microfonia, Olga e Adriano, fizeram uma entrevista com Fábbio Q e Harrison, a qual reproduzimos aqui na íntegra.

Flávio C... Anos 90... Teve um hiato. Teve projetos, como: Retrovisor, Les Estudiantes, Novos & Usados... E aí chegou o Telegramadoistresmeia. O que te levou desde os anos 80 até chegar ao Telegrama hoje?

Fábbio - Nos anos 1980, eu era um adolescente em busca de afirmação cultural e de um lugar no mundo, e naquela época, como hoje, montar uma banda era para muitos jovens uma das formas de sentir-se vivo neste mundo tedioso. E na tentativa de encontrar esse lugar no mundo, a música foi o meu principal combustível para atravessar todos esses anos. As bandas e os projetos terminam, mas o vírus fica incubado e o Telegrama236 é a mais nova forma de manifestação desse vírus.

E mesmo antes do Flávio C, teve a Banda Egypto, o Meninos de Engenho, os Filhos de Maria... Tudo somando ou subtraindo vai dar no Telegrama...


Fábbio - Exato, se hoje eu escrevo e componho melhor é porque eu comecei em algum momento lá atrás a exercitar esta verve criativa. Então, o Telegrama236 tem um pouco de todas as coisas que eu já tentei fazer com música, evidentemente mais maduro e mais experimentado, e claro, com as referências do mundo e da vida de agora.

Como você chegou ao Telegrama, como você chegou aos caras que hoje tocam contigo?


Fábbio - Na verdade, é como nós chegamos ao Telegrama236. Eu e Harrison nos conhecemos em 2005 na loja de discos Dimensão Sensorial em João Pessoa. No final de 2010 nós começamos a escrever umas canções juntos, e em um mês nós tínhamos 20 músicas prontas. Gravei essas músicas em casa, num esquema low-fi, e fomos mostrando aqui e ali para algumas pessoas, até que decidimos transformar esse material num disco e dar um nome para o projeto. Como a nossa principal escola foi o rock, sentíamos falta da presença de uma guitarra no som. Ficamos alguns meses a procura desta pessoa que pudesse assumir esse papel no projeto, daí encontramos o guitarrista Esaú Almeida, que encaixou-se no projeto como uma luva.

O que lhe chamou atenção na história musical de Fábbio?

Harrison
– A gente começou uma amizade a partir da loja porque gostávamos das mesmas bandas. Eu conhecia o Flávio C., mas nunca cheguei a ir a um show deles, fui conhecer a banda depois que acabou. O tempo foi passando e resolvemos fazer algo de uma forma bem descompromissada, daí surgiu “Noites Brancas”...

Você escreve também... Mas inicialmente não era para ser musicado, como “Pássaros”, por exemplo...


Harrison – Não, eu pensei em algo musicado, mas quando Fábbio viu, ele pensou em desenvolver mais.

Fábbio Q. – Eu conheci o poema antes de pensarmos em fazer o disco, mas a música já estava lá, foi só uma questão de encontrar a melodia certa para aquelas palavras tão sublimes.

Letras como a de “Capitalismo” e “Fora do Ar” são temas muito do punk/hardcore, faria inveja a Jello Biafra! A letra é caustica...

Fábbio  - Nós gostamos muito de sentar na frente da TV para nos divertir com o absurdo que tornou-se a vida dentro e fora da televisão, por que a televisão tornou-se um guia para a vidas pessoas, eu não consigo imaginar as pessoas sem a televisão, mas elas passam a maior parte do seu tempo diante de uma tela sendo bombardeadas pela lógica do sistema capitalista. Parece clichê, mas não é, é um fato triste, mas é verdade.

Essa é para alguém que está lendo o jornal e se pergunta: qual o som que essa banda faz?


Fábbio - A nossa principal escola foi o rock, o pós-punk talvez seja a maior de todas as influências no nosso de modo de compor e tocar. Quando estamos fazendo um reggae, como Fora do Ar, não é o gênero puro que nos interessa, mas como podemos hibridizar aquilo com as outras informações que temos. O fato de Noites Brancas ter sido composto e gravado a partir dos recursos de um sintetizador vintage, o que faz o disco soar um pouco eletro, não deixa de ser um disco de rock. Não existem mais gêneros musicais puros, por que não existe mais nada puro neste mundo; estamos vivendo a era da proliferação dos híbridos. Então, o nosso som é o resultado dessa hibridização, dessa contaminação que transformou o mundo.

Estava escutando o “Noites Brancas” e percebi que vocês economizaram em som, é algo minimalista... Opção?


Fábbio - Foi uma opção sim, a economia é uma das características mais marcantes do rock. Tentei simular uma banda de rock no sintetizador e acho que consegui. A guitarra que entrou depois das bases prontas foi a cereja do bolo. Acho, aliás, as letras muito mais minimalistas do que o som, cada palavra no disco está repleta de sentidos e significados. 

O que você colocaria mais no som se tivesse condições?


Fábbio - De fato, este disco que nós estamos divulgando é uma versão beta do Noites Brancas. É um projeto para a versão definitiva, que estamos planejando a gravação para janeiro. O disco está pronto, no estúdio vamos apenas lapidar algumas ideias e dar um acabamento na qualidade técnica do som. Manteremos os timbres, os arranjos, e a mesma estrutura das músicas da versão beta.

É a segunda vez que você fala em Sacal... Qual o papel dele nessa história?


Fábbio - Sacal foi um cara que, por incrível que pareça, o trabalho dele nos estimulou muito. Quando escutamos “Bagaceira”, pensei: quero conhecer esse cara. Me identifiquei com a música e a atitude dele e mais ainda quando soube que ele mesmo tinha sido o produtor daquela gravação. Um amigo em comum nos colocou em contato e mesmo sem ter escutado o disco ele topou gravar as guitarras e os vocais.  E foi a partir dessas gravações que começamos a divulgar a versão beta do Noites Brancas.

A música ”Mamãe, você não iria entender” é uma justificativa para a sociedade, no local de trabalho, para o sistema...


Fábbio  – Todo mundo pensa ou faz coisas que fariam qualquer um corar, mas nós vivemos numa sociedade delatora, então as pessoas procuram disfarçar suas fraquezas, cometendo seus pequenos crimes as escondidas. Isso é uma esquizofrenia aceita pelos padrões morais vigentes. Quando se é jovem, coisas como sexo, drogas e rock, são muito mais naturais e espontâneas do que no mundo dos adultos. As pessoas trabalham tanto que não tem tempo para amar, falo do amor em todas as suas dimensões, inclusive a carnal. Eu já tinha essa música pronta mas não conseguia terminá-la. A letra que Harrison escreveu encaixou como uma luva.

E a alienação reina...


Harrison - Todos os pais sonham uma vida para os filhos. Uma trajetória, uma linha de tempo, mas isso nem sempre acontece e aí você faz coisas que você não pode contar. Nem deve... É até melhor que não! Tem uma citação do Machado de Assis que eu adoro, “O maior pecado depois do pecado, é a publicação do pecado.”

Quando ouvi a música “Ligue e peça o seu” imaginei que seria um deliverer...


Fábbio  - Sim, de fato, a letra é sobre esse personagem que povoa o imaginário das cidades satisfazendo toda sorte de desejos que o dinheiro possa pagar. Esse personagem traduz muito bem a dinâmica da sociedade capitalista industrial, onde nós somos apenas um meio para satisfazer as demandas do sistema. Não existe um desejo que não possa ser realizado no sistema capitalista, “...é só pagar que ele tem...”, como está na letra da música. Você pode comprar sexo, drogas, comida, remédio, etc., sem sair de casa. Se isso é bom ou ruim eu não sei dizer. Se estamos indo na direção certa ou errada também não sei. Agora nos dêem licença que vamos atender a campainha, nosso deliverer chegou...







Nenhum comentário: